sexta-feira, janeiro 05, 2007

(233) AS PERDIÇÔES PARLAMENTARES

O Parlamento sempre lidou mal com um dos direitos elementares dos cidadãos em democracia, o direito de dirigir petições aos parlamentares. Lembro-me que na altura em que fui deputado era recorrente a discussão sobre o método, as regras e os modos de dignificar a discussão e o processo de decisão sobre as inúmeras petições dirigidas pelos cidadãos à Assembleia da República que, em inúmeros casos, jaziam anos, sim, anos, nas gavetas parlamentares, aguardando destino ou solução. A inércia burocrática, o receio de discussões incómodas, a vontade oculta de preservar o monopólio do protagonismo partidário no Parlamento, a simples preguiça, tudo tem concorrido para que as petições tenham tratamento secundário.

Muito à portuguesa, mudaram-se leis, fizeram-se brilhantes reflexões e discussões regimentais sobre o assunto, proclamou-se sagrado esse direito de cidadania, agilizou-se porventura o processo parlamentar de tratamento das petições, mas o resultado continua aquém da merecida dignidade do instituto peticionário. Agora, que está na moda pedir e falar de resultados, era bom que a filosofia dos resultados chegasse a todas as instituições do Estado e não se ficasse por mera retórica de fim de ano ou de táctica político-institucional.

Hoje, a Assembleia vai discutir no Plenário, supondo-se consequentemente que se trata de uma discussão política, no sentido mais nobre do termo, onze petições sobre os mais variados assuntos. Uma delas é a petição que a Nova Democracia dirigiu ao Parlamento pedindo que este se pronuncie pela não construção do aeroporto da Ota.

Para discutir essas onze petições cada os deputados só poderão gastar para cada assunto dois minutos e meio. Isto é, o Parlamento, em vez de discutir o assunto, vai limitar-se a despachar serviço. Ao fazê-lo, está a transmitir a mensagem aos eleitores de que não vale a pena incomodar a vetusta instituição parlamentar com pedidos, já que não há depois tempo para os analisar.

Além da petição contra a construção do aeroporto da Ota, de iniciativa da Nova Democracia, estarão em discussão outras petições sobre o encerramento da escola D. João de Castro, sobre o Rio Mondego, o encerramento de escolas no distrito de Viseu, sobre educação sexual, a carreira docente, cortes no financiamento da companhia teatral "A Barraca", sobre a criação de um regime especial de pensões para os trabalhadores das pedreiras, a representatividade política dos deficientes, a criação do curso de Medicina na Universidade do Algarve e por nova legislação para o movimento associativo. As petições são subscritas por um total de 75.176 cidadãos.

Agora que a Assembleia da República já tem bandeira própria e que o carro do seu Presidente já ostenta pavilhão próprio, bem que poderiam os deputados dar-se ao trabalho de mudar esta maneira ataviada e desprestigiante para a democracia de tratar as petições dos cidadãos.
(publicado na edição de hoje do Semanário)

1 comentário:

Anónimo disse...

Assim se prova...
a inutilidade da AR.
E dos seus deputados, quando aceitam tal estado de coisas.
Trabalho de casa, para quê?
E o seu presidente, para que serve?
Tal como os nossos votos. No bloco central.
Z